terça-feira, 23 de outubro de 2012

"Quando Cristo, num movimento simbólico, estabeleceu sua grande sociedade, não escolheu para pedra fundamental nem o brilhante Paulo nem o místico João, mas um embusteiro, arrogante e covarde – numa palavra, um homem. E sobre esta pedra construiu sua Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão. Todos os impérios e reinos se desvanecerão, pela fraqueza inerente e contínua de terem sido erigidos sobre homens fortes. Mas aquilo que é único, a Igreja cristã histórica, foi edificada sobre um homem fraco, e por essa razão é indestrutível. Pois nenhuma corrente é mais forte que o mais fraco dos elos."
G.K. Chesterton, em Hereges, 1905

domingo, 21 de outubro de 2012

sábado, 20 de outubro de 2012

Mariana,

não lembro de nenhum momento da minha vida em que você não estivesse presente. pensar nisso é um conforto para a solidão.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

12 de outubro


acho o dia das crianças uma data muito bonita. sempre achei, exceto quando fui criança. sempre me constrangi muito com essas datas comemorativas, festas familiares, distribuição de presentes. passar por essas situações era passar por uma provação social sem nenhum prêmio de recompensa. fui uma criança muito infeliz, incompleta, necessitada. nunca entendi nada direito, inventei muitas coisas para meu próprio deleite (ou desgraça), me isolei muito, li demais. fiz tudo errado tentando acertar. sempre convivi com muita dor com o amor obsessivo da minha avó, com o afastamento da minha mãe, com os sacrifícios do meu pai; pessoas que de alguma maneira me transmitiram algumas coisas de forma errada. não por culpa deles, é claro, mas por um desequilíbrio meu que nunca soube consertar. levei muito disso para minha adolescência, passei anos absolutamente transtornada, sem noção de realidade alguma, negando tudo o que pudesse me ajudar.
desaguei todas minhas frustrações e complexos numa vontade muito grande de dar amor, contra todas as previsões. me sensibilizo pra caralho com as pessoas, sinto muita compaixão. sempre fiz amigos maravilhosos, mas quase todas as vezes que me relacionei romanticamente foram com as pessoas erradas. tenho uma capacidade de perdoar que não sei de onde vem, nem se é saudável ou sintomática, mas que sempre facilitou a vida dos que se aproximaram de mim, em detrimento da minha própria felicidade. em anos muito ruins, conheci dois grandes pilares da minha existência: régis e mariana. ganhei tanto apoio, amei e ganhei tanto amor dos dois que hoje em dia não duvido mais da providência divina. minha adolescência não foi apenas uma continuação da minha infância problemática, mas uma época de desafios tão difíceis que alguma coisa dentro de mim sempre vai me considerar uma vencedora. passei pelos anos escolares sofrendo muito, nunca me adequei, demorei para aprender a lidar com a minha sexualidade atravessada, tive muitos romancezinhos e fui motivo de chacota em infinitas situações. não sei se amadureci muito rápido ou se não amadureci ainda: hoje em dia tenho plena noção do espaço que me cerca, mas ajo como uma criança saudosa muitas vezes. tenho menos coragem do que gostaria, é verdade, mas tenho um sentimento estranho ao ver que tenho mais coragem do que a maioria das pessoas da minha idade. não me considero velha, mas sei que já não sou uma garotinha. deveria ter muitas coisas resolvidas, não consigo me adaptar ao modo de viver da maioria, não entendo por que deixam tudo para depois.
nos últimos dois anos, me estabilizei emocionalmente como nunca pensei que conseguiria e sei que o ponto de partida dessa transformação é o marlon. meu namorado me ajudou a colocar muitas coisas no lugar e, pela primeira vez, convivo com alguém com quem posso dividir meus problemas e que, na medida do possível, torna as soluções mais fáceis pra mim. cresci, também, porque as fragilidades dele exigiram de mim uma força e uma abdicação que não tive a opção de negar. muitas pessoas me perguntam como consigo manter esse relacionamento à distância com tanta seriedade, e sempre respondo a mesma coisa: "cada um se vira como pode!", me parece tão claro. nunca sei se as pessoas são cegas ou insensíveis.



escrevi isso no último feriado, viajando com a minha família, por falta de coisa melhor para fazer. lembro que parei de escrever aí porque as crianças vieram me chamar para brincar.
(falei mais sobre mim aí do que em toda minha vida, ainda que pela metade)

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

afobamento

estou há horas com uma ansiedade e uma angústia insuportáveis, me sentindo bem pequena. respiro fundo, me estico, volto ao normal e estou muito pequena de novo. é uma afobação presa na garganta, não sei explicar. parece que voltei aos 15 anos. quando fazia terapia, tomava FLORAIS DE BACH para ansiedade. não queria voltar a isso, não queria mais perder esse tipo de controle. é engraçado: quatro horas sem fazer nada e eu fico nesse estado de respiração rápida. não sei lidar com tédio, talvez porque nunca tive muitas oportunidades de aprender. não se ocupar é muito ruim. só se tem transtornos e complexos quando não se tem mais nada a fazer. quando me tratava, achava besteira. agora, não. agora sei que por mais que as tentativas sejam fracassadas, sempre se encontra um novo caminho (para tentar. sempre tentar). se tivesse me dedicado, talvez tivesse me dado melhor. minha psicóloga era uma velinha de nariz grande. na minha primeira consulta, ela falou de seu próprio nariz, ao invés de falar do meu. percebi que não estava sozinha.

PS.: essa chuva caindo atrás de mim só piora. não gosto de chuva. não gosto, não gosto, não gosto.

domingo, 7 de outubro de 2012

"Desde a mais tenra idade, talvez desde os cinco ou seis anos, eu sabia que, quando crescesse, seria um escritor. Entre os dezessete e os vinte e quatro anos, tentei abandonar esta idéia, mas fiz com a consciência de que estava atacando a minha verdadeira natureza e que, mais cedo ou mais tarde, teria que me acomodar e escrever livros. (...) Por esta e outras razões, eu era bastante solitário – e logo desenvolvi os maneirismos desagradáveis que me tornaram impopular durante meus dias de estudante. Eu tinha o hábito – de criança solitária – de inventar histórias e ter conversas com pessoas imaginárias – e acho que, desde o começo, minhas ambições literárias estavam misturadas com o sentimento de ser isolado e desvalorizado. Eu sabia que tinha facilidade com as palavras e o poder de encarar fatos desagradáveis – e sentia que isto criava uma espécie de mundo privado no qual eu podia me recompensar pelas faltas na vida diária."
George Orwell, em Por Que Escrevo, 1946

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

argumentum ornithologicum


"Fecho os olhos e vejo um bando de pássaros. A visão dura um segundo, talvez menos; não sei quantos pássaros vi. Era definido ou indefinido seu número? O problema envolve o da existência de Deus. Se Deus existe, o número é definido, porque Deus sabe quantos pássaros vi. Se Deus não existe, o número é indefinido, porque ninguém conseguiu fazer a conta. Neste caso, vi menos de dez pássaros (digamos) e mais de um, mas não vi nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três ou dois pássaros. Vi um número entre dez e um, que não é nove, oito, sete, seis, cinco, etcetera. Esse número inteiro é inconcebível; ergo, Deus existe."
Jorge Luis Borges, em O Fazedor, 1960


deus é o poder da palavra. dia desses, falando sobre isso com um amigo ateu, percebi estava recitando poesias a um cavalo. não se reproduz uma presença com palavras; a presença é a palavra. seu poder se mostra dentro, e não fora. sinto a presença de deus muitas vezes, tenho um corpo aberto, livre.
penso que se tem realmente certeza da própria fé quando a palavra d'Ele é tão grande que todo resto parece um sopro.